[Drop 001] O Labirinto do Fauno me fez um carinho

É a segunda vez nesse mês que eu sinto uma vontade irresistível de escrever um pouco sobre algo que já li. A primeira, foi sobre alguns contos do Cortázar. Eu resisti a tentação e nada aconteceu, desta vez, porém, não tive a mesma resistência. É preciso deixar escrito e à vista.

Um relato.

A pouco acabei de ler um livro chamado Schismatrix, a obra maestra de Bruce Sterling. Tinha certas expectativas sobre a história e acabei a leitura com ressalvas. Não seria exato usar odiar ou gostar, arrependido ou não, apenas aceito o que li e tenho o livro como “lido”. Embora, em boa parte da reta final, só queria acabar de uma vez e seguir a próxima leitura, porque a progressão narrativa dele é, sem a menor sombra de dúvidas, terrivelmente truncada. Desta forma, demorei mais de um mês para ler suas quase 300 páginas, mas, por fim, acabei e decidi já adiantar a próxima leitura.

Umas poucas páginas. Só o primeiro capítulo.


Seria um livro da Virginia Woolf, mas por indicação tinha adiantado o Labirinto do Fauno na lista. E que decisão acertada. Eu não quero comparar os livros, até porque a complexidade da história e temática de Schismatrix são bem superiores, mas o Labirinto do Fauno tem uma questão que facilmente supera a complexidade, além do que o livro é complexo dentro de seus próprios temas, que é sua narrativa.

A máxima: um plot ruim, bem contado, se torna uma boa história.

Então, o plot de o Labirinto do Fauno é ruim?

Ao contrário!

E, agora, fica fácil de entender o motivo desse relato: a narração da Cornelia Funke é uma coisa inacreditável e quase indescritível. Não sou muito de ficar observando detalhes técnicos enquanto leio, mas seria hipocrisia dizer que não o faço. Acontece no automático e, de repente, estou divagando com a narração/narrador sendo o foco, geralmente, aliado à técnica pessoal do escritor. Já deixei de ler história por fugir de algo mais pessoal e ficar presa numa zona de conforto que quase me levou aos caminhos catedráticos de uma redação do Enem. O toque pessoal ou até mesmo uma técnica mais fechada são muito importantes para mim, o Labirinto do Fauno, eleva esse detalhe a outro nível. O método de narração usado não é copiável por meios técnicos, pode ser tentado atingir um resultado igual mecanicamente, embora duvido que será atingido.

O motivo?

A narrativa é sensível e pessoal a um ponto absurdo que apenas umas poucas histórias possuem –  como as Crônicas Prydan e o segundo livro do Ciclo Terramar – e, para que fique fácil de entender para quem nunca leu um desse, pensei numa alusão bem simples: é como um pai ou uma mãe contando uma história para os filhos. As palavras vêm e as várias páginas vão e vão, uma citação mais impactante que a última e, de repente, lá se foi uma hora sem você sequer ter notado que na verdade só ia ler o primeiro capítulo.

Por fim, dá resumir da seguinte forma: depois que Schismatrix me cansou, o Labirinto do Fauno me fez um carinho.

Leiam e recebam o mesmo.

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